Enquanto bebia os dois dedos de água para engolir o remédio controlado, Ligia pensava naquela música do Cazuza que sempre achou se encaixar em seu amor.
Lembrou que não lembrava de jamais ter sentido sabor de fruta mordida enquanto esteve com ele, mas algumas vezes já ficaram na rede sobrevivendo de beijos.
Pensou nas sessões de terapia e conseguiu ver que realmente eram o pão para o outro, tamanha a necessidade daquele relacionamento. Um pão estragado que deu dor de barriga, mas ainda um pão.
Ligia foi deitar novamente e colocou a tv no 'mudo'. Afinal, ouvir um sotaque italiano tragi-cômico não ia ajudá-la a analisar sua música-relacionamento.
Resolveu então cantarolar a música para não perder nenhum tópico de comparação.
"Pelo inferno e céu de todo dia... praaa poesia que a gente não vive...." (!) Inferno e céu, céu, inferno, inferno, inferno, céu. Era realmente um relacionamento de montanha-russa... Bipolar! Não era ela então, a bipolar! Era o amor!!
E a poesia... Putz, o Cazuza era foda! Era tanta poesia falsa naquele amor que o que eles viviam não estava nem perto de ser uma poesia ou mesmo qualquer coisa bonita ou qualquer coisa que o valha!
Caramba, saquei...!
Parou para ver a propaganda que tanto gostava e se pegou cantarolando de novo....
"E o corpo inteiro como um furacão.... boca, nuca, mão e a sua mente nãããão...." Céus! Ela teve um estalo tão alto que talvez o vizinho tenha ouvido... Se não achasse muito abuso teria ligado para a psicóloga e contado que era exatamente aquilo: eles tinham todo o amor que havia, com muita boca, nuca e mão, mas sem nenhuma mente envolvida! Nada de profundidade ou sobriedade.
Bom, de qualquer jeito sorriu. A próxima sessão ia render dentro daquela horinha.
E gargalhou. O remédio da alegria tinha acabado de fazer efeito.
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