quinta-feira, 3 de abril de 2008

a bela travessa dos poetas de calçada

Eu sempre senti uma certa antipatia pelo centro da cidade.
Mas eu nunca tinha parado pra pensar que o que eu não gosto é o que o Centro se tornou. Aquela sujeirada, um monte de gente adoravelmente enfiando panfletos na sua cara, uma confusão generalizada de ônibus, aquele monte de camelô diminuindo o espaço de passagem e aumentando o delicioso contato físico e aqueles bares de qualidade reprovável com seus salgadinhos pingando gordura. Não tenho nada contra esse estilo Centro de ser. Algumas vezes por ano dava uma passadinha por ali, comprava alguns trecos baratinhos e comia em algum lugar onde o salgado e o refresco estivessem na super promoção de dois reais. E sempre pego os panfletos, eles estão trabalhando honestamente afinal. Você tb deveria pegar.
Voltando ao pensamento do dia.
Hoje particulamente a antipatia estava inchada, já que o Centro era o último lugar em que gostaria de estar e a finalidade da minha vinda tb não ajudava. Tampouco o meu estado de espírito (vale informar que mesmo em dias bons, eu não sou nada boa antes das 10 pelo menos).
Estava lá sentadinha no 709 xingando todas as pessoas sorridentes e as que ainda dormiam, quando uma plaquinha me chamou a atenção (sempre leio todas as plaquinhas com nome de rua, mesmo que duas plaquinhas depois eu já não me lembre). Travessa Cazuza. Nem preciso dizer que essa eu não vou esquecer, preciso?
Meu humor já deu aquela melhorada. Fui olhando o Centro com novos olhos. Desci no ponto do prédio da Petrobrás e fui andando tentando reparar em tudo daquele lugar que vou começar a rever diariamente.
Um pouquinho antes de chegar no tal prédio comercial, vi uma outra travessa que antes tinha conquistado a minha simpatia, mas rapidamente. Travessa dos Poetas de Rua. Ler essa plaquinha me tirou totalmente da realidade e ligou o automático. (Gosto muito de pensar que as travessas receberam o nome do que acontecia por ali. Acontecia tanto que aquilo se tornou sua identidade e ao longo do tempo as pessoas começaram a se referir a ela como tal. Até depois merecerem uma plaquinha azul.)
Travessa dos Poetas de Rua. Isso me fez lembrar de tudo que eu já tinha pensado sobre o Centro nesse ano que eu o frequentei mais do que, talvez, a vida toda.
Aqui pertinho tem um prédio enorme abandonado. Cinema Vitória (se a minha memória estiver dando uma dentro). É linda a entrada do prédio. Lógico que linda aqui é abandonada, sem cuidados, invadida e provavelmente utilizada como toilette dos necessitados e "tudo mais" dos vândalos por natureza. Mas me encantou. Assim como me encantou o Campo de Sant'Anna todos os dias quando eu voltava do curso de italiano. É estranho você pensar em antes de todo esse abandono e deterioração.
Eu gosto de imaginar isso aqui quando as pessoas saltavam dos seus carros modernos e entravam felizes no Cinema Vitória exibindo seus vestidos novos. Quando famílias brincavam no domingo e casais apaixonados namoravam de mãos dadas no Campo de Sant'Anna (e podiam sentar na grama sem medo de se sujar, digamos assim).
Gosto particularmente de imaginar que logo aqui do meu lado há algumas décadas se sentavam adoráveis poetas bêbados na calçada e ficavam por ali até o dia recomeçar.
Deviam ser bons tempos.
Deviam ser bons poetas.


Perto da Travessa do Cazuza, tem a Travessa das Belas Artes. Imagino quem não sairia de lá.

Nenhum comentário: