terça-feira, 27 de maio de 2008

pontocompontobêerre

Ela se orgulhava de ser uma mulher moderna. Aproveitar ao máximo tudo que a tecnologia tinha a oferecer.
Fazia compras passeando pelos sites. Até supermercado era sentadinha na sua confortável cadeira de couro sintético branco.
Escrevia críticas gastronômicas para uma revista importante e só saía de casa para o seu delicioso trabalho. Ou para resolver problemas na escola dos meninos.
Adorava dizer que era "mãe de dois" só para ouvir "nossa, com esse corpo??". Mas gostava ainda mais quando diziam que eram "ótimos meninos" e que "criar meninos não é fácil". É, ela sabia que não era. Ainda mais sem um pai por perto. Nem o seu pai estava mais ali, mas tinha tido grande papel e importância na vida dos seus meninos até a hora de ir. Agora era só ela e os dois. E ela se virava bem.
O trabalho com horário "livre" era perfeito e resolver as coisas por computador deixava todo o resto do tempo para o que dava mais trabalho, ser mãe.
Enquanto pagava contas, escrevia para a coluna e comprava coisas, o messenger estava aberto, os scraps eram respondidos e é aí que começa o que eu vim contar.
Achou umas fotos dentro de um livro que leu quando estava na faculdade. Fotos de uma viagem, um feriado prolongado em Verão Vermelho, o point entre os amigos da época. Abriu logo a janela de uma das personagens das fotos e começaram a relembrar esses tempos. Lembraram de uma banda que ouviram em um sarau, no bar mais 'descolado' da pracinha, e gostaram bastante. Lembraram o nome da banda e ela arriscou procurar no MySpace. Claro que achou, senão não teria o que ser contado, mas para ela foi só mais uma prova das maravilhas da Internet.
Bom, achou os caras, perguntou se eles se lembravam do sarauzinho e resolveu manter contato, relembrar uma época que não pensava em filhos, em contas nem em Internet.
O vocalista tinha morrido de overdose, eles já estavam com outros há uns anos, mas tirando isso a banda era a mesma.
Depois de dias conversando com o tecladista (viúvo e inteirão), descobriram uns dois ou três amigos em comum, vários interesses e 'causos' parecidos e assistiram à mesma palestra sobre "Liberdade de expressão".
Lógico, marcaram um chope.
E de repente, ela se sentiu com nervosos 20 aninhos de novo. Não sabia o que vestir, não sabia o que calçar, não sabia o que dizer, pensou em dizer que estava com dor de barriga. Ah, não! Dor de barriga não! Pelo menos podia dar uma desculpa de 40.. Problemas com os filhos. E se podia dar uma desculpa adulta, poderia ter uma atitude adulta! Poderia? Unhas quase roídas e um pacote de biscoitos a menos na despensa... Resolveu que ia sim! Vestiu um jeans não muito apertado, uma blusinha, aquele casaco novo e... um salto! Afinal, não tinha mais 20. Cabelos presos ou soltos? Já que não tinha lavado, foi com eles presos (num rabo-de-cavalo talvez um pouco alto demais...).
Deu um beijo nos filhos, passou um batonzinho e foi curtir a vida aonde as pessoas olham nos olhos e não para as fotos e nós ouvimos uma voz e não um barulhinho quando falam conosco.

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